A REVOLUÇÃO RUSSA (1917)

Para entender os motivos que levaram à eclosão da Revolução Russa, analisaremos as principais características do Império Russo na virada do século XIX para o XX política, econômica e socialmente.

1. A RÚSSIA PRÉ-REVOLUCIONÁRIA


O czar Nicolau II deposto pela
Revolução de 1917.
Politicamente, o Império Russo era controlado por um czar (ou tzar). O czarismo era um tipo de monarquia absoluta russa, e a família Romanov (segunda dinastia imperial) era soberana há mais de 100 anos. O czar apoiava-se na nobreza rural e na burocracia e, como governava de forma autocrática, partidos políticos que fizessem oposição ao regime eram banidos e tinham que atuar na clandestinidade.

Economicamente, a Rússia pré-revolucionária ainda apresentava resquícios feudais no início do século passado. Um exemplo disso é o fato de a sua economia ainda ser basicamente agrícola, além de as poucas indústrias existentes (principalmente as bélicas) serem extremamente dependentes do capital estrangeiro. O único setor em que a escassa burguesia russa atuava com capital próprio era o têxtil, abrindo espaço para que a industrialização ocorresse "de cima para baixo", ou seja, sob forte intervenção do governo sem dar margem a qualquer tipo de contestação.

Socialmente, a Rússia Imperial era assolada por uma série de tensões. A massa camponesa recém liberta da servidão era quem arcava com a vultosa carga fiscal. Além disso, havia carência de terras e má distribuição de renda, o que levava ao gradativo empobrecimento da população que não fazia parte da nobreza.

Todos esses fatores faziam com que existisse uma forte oposição ao regime, que tomava forma a partir de intensa propaganda revolucionária encabeçada pela parte da população que era oprimida pela autocracia czarista. Grupos anarquistas, por exemplo, realizaram atentados terroristas que chegaram, inclusive, a vitimar o próprio czar Alexandre II, em 1881.

Seus sucessores, ao invés de levar em conta os problemas sociais e reformar a economia, preferiram abafar os protestos, reprimindo jornais, universidades e partidos políticos clandestinos. 

Uma maneira de burlar a repressão czarista era atuar no exterior, em exílio, enviando à Rússia imperial panfletos que divulgavam a doutrina marxista. Esta, inclusive, serviria de base teórica para a fundação do Partido Operário Social-Democrata Russo em 1898, que viria a se dividir em duas facções em 1903: os bolcheviques e os mencheviques.



Os bolcheviques (a maioria) eram liderados por Vladimir Ilitch Ulianov (Lenin) e Leon Davidovitch Bronstein (Trotsky) e favoráveis à atuação revolucionária, através de uma aliança entre operários e camponeses, contra a autocracia czarista.


Lenin



Trotsky
Os mencheviques, por sua vez, foram liderados por Julius Martov e Alexander Kerenski e defendiam a queda do czarismo por meio de reformas levadas a cabo junto à burguesia.


2. O DOMINGO SANGRENTO

As elites dirigentes russas consideravam seu poderio bélico maior do que era na realidade, por isso lançou o Império numa guerra contra o Japão por porções de terra na China (a Guerra Russo-Japonesa -1904/1905), mas foi derrotado rapidamente. 

A derrota nesse conflito aprofundou as tensões sociais, levando a população a manifestar-se pacificamente, encaminhando ao czar uma petição que versava sobre a redação de uma Constituição, o sufrágio universal, a redução da jornada de trabalho e a fixação de uma salário mínimo. 

Apesar de pacífico, o movimento foi massacrado pelas tropas cossacas em frente ao Palácio de Inverno. Esse episódio acabou entrando para a História como Domingo Sangrento.

A violenta repressão, no entanto, não foi capaz de atenuar a insatisfação popular e, como o czar se negava a tomar medidas concretas quanto às reivindicações, novos atos terroristas e motins ocorreram. Foi o caso da revolta de marinheiros russos contra as altas patentes militares que foi imortalizado por Hollywood com o filme O Encouraçado Potemkin.


3. A MONARQUIA RUSSA (1905/1917)

Acuado, o então czar Nicolau II foi obrigado a ceder e promulgou o Manifesto de Outubro, uma Carta que transformava a Rússia numa monarquia constitucional.

Porém, apesar de aparentar uma avanço para grande parte da população, a convocação de  eleições para uma Duma (parlamento) frustrou todas as expectativas: o voto seria indireto para camponeses e trabalhadores urbanos e czar poderia interferir nas atribuições da Assembleia. A Duma, assim, só contaria com representantes dos ricos e daqueles que eram leais ao governo.

Pouco a pouco, a orientação absolutista voltava à tona, o que não tardaria a reacender as agitações e ativismo político dos partidos socialistas.

Aos problemas internos somou-se o fato de a Primeira Guerra Mundial ter-se iniciado. Apesar o entusiasmo patriótico inicial, as pessoas foram-se convencendo de que a guerra de trincheiras seria longa e penosa demais para uma Rússia com tamanhas dificuldades internas e de que o esforço de guerra teria um alto custo para a população.


4. A REVOLUÇÃO DE FEVEREIRO

O ingresso do Império Russo na Primeira Guerra Mundial se deu devido ao sistema de alianças formado pelas principais potências do mundo, já que a diplomacia secreta e foi um fator externo para a eclosão da Revolução Russa.

A Revolução de Fevereiro foi a primeira fase desse processo, já que possui características bem distintas da segunda fase, que veremos a seguir: foi liderada pelos mencheviques.

Principalmente por conta da participação russa na Grande Guerra, a população retomara as agitações políticas. Foi então que os mencheviques aproveitaram para pôr em prática seu projeto para a queda do czar.

A multidão tomou a Duma (parlamento) e teve suas demandas apropriadas pelo líder dos Trudoviques (partido da pequena burguesia) Alexander Kerenski. o czar abdica e dá-se início a um governo provisório, de caráter liberal-burguês. Paralelamente, operários, camponeses e soldados organizaram em torno dos sovietes, entidade que representava especificamente as suas reivindicações. Foi a primeira fase do processo revolucionário.


5. A REVOLUÇÃO DE OUTUBRO


Em abril, Lenin, líder dos bolcheviques, volta do exílio com as suas Teses de Abril, escrito que pregava a formação de uma República de Sovietes, a nacionalização dos bancos e das propriedades privadas e a saída imediata da Rússia revolucionária da Primeira Guerra. As ideias dos bolcheviques eram, assim, bem diferentes das dos mencheviques, que, por exemplo, defendiam a permanência no conflito, já que isso garantiria o lucro dos burgueses.

Dada esse conflito de interesses entre as duas facções do Partido Operário Social-Democrata Russo, os bolcheviques iniciaram uma verdadeira campanha de repúdio à burguesia, conclamando "Todo poder aos sovietes" e foram obtendo cada vez mais adesão dos membros dos sovietes e influência no processo revolucionário.

A burguesia perdia cada vez mais apoio político, e crescia o movimento popular que queria mais poder para os sovietes.

Trotsky, líder do soviete de Petrogrado, criou a Guarda Vermelha e depôs o governo provisório (a República burguesa), e ficou decidida a criação de uma nova entidade de governo: o Comitê dos Comissários do Povo, que coordenaria todos os sovietes e contaria coma liderança de Lenin.
Além disso, ficou estabelecido:

  • a assinatura de um tratado para a saída da Rússia da Primeira Guerra Mundial ( o Tratado de Brest-Litovsky);
  • a autodeterminação dos povos que viviam sob a égide do antigo Império Russo;
  • a adoção do partido único: o Partido Bolchevique;
  • a organização do Exército Vermelho;
  • a reforma agrária;
  • o fim da propriedade privada;
  • a nacionalização dos bancos e dos investimentos estrangeiros;
  • a adoção do regime de autogestão operária em que as fábricas passariam a pertencer aos próprios trabalhadores;
  • a instauração da ditadura do proletariado.
Era a o triunfo da Revolução de Outubro ou Revolução Vermelha ou Revolução Bolchevique.


6. A GUERRA CIVIL (1918/1921)

Os contrarrevolucionários que pretendiam restaurar o Antigo Regime organizaram o Exército Branco, com apoio de França, Inglaterra, Japão e Estados Unidos (que temiam a expansão do socialismo), e deu-se início a uma guerra civil. O conflito teve duração de três anos e terminou com a vitória do Exército Vermelho.


7. A CRIAÇÃO DA UNIÃO DAS REPÚBLICAS SOCIALISTAS SOVIÉTICAS (URSS)

Durante a guerra civil, a política econômica adotada pelos bolcheviques foi chamada de comunismo de guerra e consistia em:

  • confiscar os latifúndios sem indenização;
  • regulamentação do consumo e da produção;
  • expropriar as grandes indústrias;
  • obrigar os camponeses a entregar parte da produção para o governo.
Tais medidas provocaram o colapso da economia russa a níveis inferiores aos da época do czarismo, por isso Lenin adotou a NEP (Nova Política Econômica). A NEP foi uma espécie de retorno controlado ao capitalismo, já que Lenin avaliou que, ao contrário do que ele tinha previsto, o Império Russo não estava totalmente pronto para o socialismo.

Para entendermos isso melhor, é preciso compreender que Lenin se embasava nas ideias de Karl Marx. Este afirmava que um modo-de-produção só era substituído por outro devido a contradições internas que faziam com que ele não fosse mais possível. Tomemos como exemplo a queda do modo-de-produção feudal. com o Renascimento comercial e urbano, surgiu a burguesia, e a economia da Idade Média deixava de ser agrária e de subsistência para dar início a uma economia de mercado, que visava ao lucro. Tais modificações na economia refletiram sobre a sociedade como um todo e fizeram com que o modo-de-produção feudal deixasse de ser compatível com a realidade. Assim, seria a própria evolução desse modo-de-produção que provocaria sua transição para o capitalismo.

Da mesma maneira, Marx analisara que o modo-de-produção capitalista teria sua derrocada quando atingisse o grau máximo de suas contradições, ou seja, o capitalismo é uma fase obrigatória para que surja o socialismo. O socialismo surgiria por conta dos diversos problemas causados pelo capitalismo.

Como a Rússia ainda tinha resquícios feudais e era pouco capitalista (como afirmamos no início do post), Lenin reavaliou sua conduta e acreditou que seria importante amadurecer o capitalismo na região para que, posteriormente, o socialismo tivesse sucesso. Pessoalmente, acho essa capacidade de autocrítica de Lenin algo muito louvável.

Assim, a NEP possuía as seguintes medidas:

  • canalização de recursos estrangeiros para a indústria de base;
  • organização da agricultura e do comércio por meio de cooperativas;
  • livre comércio interno;
  • autorização das diferenças salariais.
Essas medidas retomaram o crescimento econômico e da produtividade na Rússia Vermelha.

Politicamente, criou-se a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, formadas por Rússia, Transcaucásia, Ucrânia e posteriormente Uzbequistão, Turquemenistão e Tadiquistão.





7. A MORTE DE LENIN E A DISPUTA PELA SUCESSÃO

Lenin morre em 1924, e o poder passa a ser disputado por duas grandes figuras entre os bolcheviques: Trotsky e Stalin.

Mais do que uma luta pessoal, era uma luta de duas correntes de pensamento distintas: enquanto Trotsky defendia a revolução permanente, ou seja, a necessidade de propagar a revolução socialista pelo mundo; Stalin pretendia limitar o socialismo a um só país, a fim de consolidá-lo.


Stalin
Aproveitando-se do fato de Trotsky estar doente, Stalin, secretário-geral do Partido Comunista, destituiu-o do cargo de comissário do povo para assuntos de guerra em 1925. Depois, isolou-o cada vez mais, expulsando-o do partido em 1927 e da própria URSS em 1929. Trotsky refugiou-se no México, onde foi assassinado em 1940.
Stalin iniciou, então, seu projeto, que culminou na traição total da Revolução de 1917, uma vez que, durante o período em que esteve no poder, afastou aos poucos seus opositores até se tornar um ditador absoluto, mas isso já é assunto para outro post.


8. CONCLUSÃO

A importância da Revolução Russa está no fato de que foram colocados em prática os princípios do socialismo científico de Karl Marx pela primeira vez, constituindo sua primeira experiência histórica.

A Revolução de 1917 ainda serviu de influência para revoluções posteriores. Analisando as desigualdades que o sistema capitalismo impõe, os movimentos socialistas ao redor do mundo foram-se apropriando das ideias de Lenin e de Karl Marx para lutar elos seus direitos.


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O blog ainda conta com outros posts sobre o mesmo tema nos links abaixo:








Comentários

Unknown disse…
Post realmente excelente, parabéns!
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